sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012


WINNICOTT  E A MÃE SUFICIENTEMENTE BOA

Donald Woods Winnicott (1896-1971), nasceu em Plymouth, Inglaterra, estudou medicina e especializou-se em pediatria.  Após contato com trabalhos de Freud, Winnicott decidiu-se por se tornar analista de crianças. Assim, sob a orientação de Melanie Klein, psicanalista de crianças em Londres, iniciou seu trabalho analítico.

Formulou conceitos sobre os transtornos em crianças com base em suas observações de crianças abandonadas e institucionalizadas, separadas de seus pais. Observando as relações familiares, reparou que o desenvolvimento psicológico dos primeiros anos de vida da criança são fundamentais para a  saúde psíquica do indivíduo.

Durante as sessões de atendimento, Winnicott procurava interagir com a criança e muitas vezes a presenteava com um aviãozinho de papel ou um leque, como uma forma dela levar para a sua vida um pouco do espaço terapêutico.

Winnicott valorizava o atendimento interdisciplinar, incluindo assistentes sociais, profissionais de saúde, religiosos e educadores em suas intervenções. Também orientava pais e mães nos cuidados com seus filhos. Acreditava que a mãe era a principal referência amorosa para o bebê. Por isso o vínculo mãe e filho era importante por toda a vida do sujeito, pois para existir como pessoa o bebê precisa dos cuidados de um outro sujeito humano.


O ser humano, para Winnicott, nasce como um conjunto desorganizado de pulsões, instintos, capacidades perceptivas e motoras que conforme progride o desenvolvimento vão se integrando, até alcançar uma imagem unificada de si e do mundo externo. Para isso, inicialmente, o bebê depende  da mãe ou de alguém que exerça a função materna e do ambiente.  O Recém-nascido não consegue distinguir uma “coisa” de outra, uma coisa externa do seu próprio corpo e não percebe o que o rodeia como sendo separado dele. O seio materno, que satisfaz suas necessidades, é percebido como parte de si.

Para Winnicott, o papel da mãe é prover o bebê de um ego auxiliar que lhe permita integrar suas sensações corporais, os estímulos ambientais e suas capacidades motoras nascentes.  Desde a gravidez a mãe desenvolve uma preocupação em que coloca o bebê como o seu centro e essa preocupação vai se extinguindo progressivamente. Essa preocupação maternal primária dá à mãe a capacidade de se colocar no lugar de seu filho e responder às suas necessidades e graças a essa adequação precoce, o bebê não sente nenhuma ameaça de aniquilação e pode investir, sem perigo, no self. 

A mãe suficientemente boa funcionará como uma proteção ao ego frágil da criança, fortalecendo assim o seu self. O bebê sente-se como onipotente e Winnicott diz que a “mãe boa” é a que responde a onipotência do lactante e, de certo modo, dá-lhe sentido até que pouco a pouco a criança procurará substituir a proteção que lhe falta por uma “fabricada” por ela mesma. Posteriormente, a mãe se cura desse estado e aceita não ser mais totalmente gratificadora para seu filho: torna-se simplesmente uma mãe suficientemente boa, isto é, uma mãe que apresenta deficiências transitórias, mas que jamais serão superiores àquilo que seu bebê pode experimentar.

Quando a mãe não fornece a proteção necessária ao frágil ego do recém-nascido; a criança perceberá esta falha como uma ameaça à sua continuidade existencial, a qual, por sua vez, provocará nela a vivência subjetiva de que todas as suas percepções e atividades motoras são apenas uma resposta diante do perigo a que se vê exposta.

A mãe que “não é boa”, inadequada, é incapaz de interpretar as necessidades da criança deixando de responder ao seu imaginário onipotente. Isso fará com que a criança desenvolva uma “casca” (mecanismos de defesa), com a finalidade de se proteger da hostilidade do ambiente.   A criança na maior parte do tempo se sentirá submissa ao ambiente, à mãe. Criará um falso self que utilizará para lidar com a realidade na qual convive.  Winnicott diz que o self falso se encontra representado por toda a organização da atitude social cortês e bem educada. Produziu-se um aumento da capacidade do individuo para renunciar a onipotência ganhando assim um lugar na sociedade que jamais se pode conseguir manter mediante unicamente o self verdadeiro. O falso self, especialmente quando se encontra no extremo mais patológico da escala, é acompanhado geralmente por uma sensação subjetiva de vazio, futilidade e irrealidade devido às várias “cascas” sobrepostas.

Em contrapartida, quando a mãe é suficientemente boa, a criança desenvolve um sentimento de onipotência: tem a ilusão ativa de criar o mundo em torno de si. Essa “atividade mental da criança transforma um ambiente suficientemente bom em ambiente perfeito”. Isso permite à psique da criança residir no corpo, atingindo a unidade psique-soma, base de um self autêntico. Ao mesmo tempo, diante das inelutáveis pequenas deficiências da mãe, a criança experimenta uma desilusão moderada.

Tal desilusão é necessária e a criança se adapta a ela ativamente substituindo a ilusão primitiva por uma área intermediária, área da criatividade primária: é a isto que Winnicott chama de área transicional, cujo representante mais característico é o objeto transicional – um brinquedo ou um objeto no qual a criança se apega e com ele interage.

Apesar da relação mãe e filho (díade) ser tão desigual, ela constitui  experiência fundamental para o ser humano, pois, certamente, pode conter, para o sujeito que a experimenta, a origem, o substrato de toda as subseqüentes características das relações sociais que ele vai desenvolver de ordem superior ao longo de sua vida.

Espera-se que os bons aspectos da mãe prevaleçam sobre os maus aspectos e, da mesma maneira, o impulso libidinal da criança prevaleça sobre o agressivo. Conseqüentemente, o objeto bom parece predominar nessa fusão e, por isso, é que o objeto libidinal foi chamado objeto de amor. Se suprimirmos a expressão de um dos impulsos ou facilitarmos em detrimento de outro, estaremos dando início às relações objetais mal formadas.  Em geral, é a mãe que facilita ou reprime. Ela pode acentuar o objeto bom ou o objeto mau. A capacidade de adiar a satisfação do impulso, de tolerar uma demora na descarga da tensão, de desistir de um prazer imediato e talvez incerto em troca de prazer posterior, é um passo importante na humanização do homem.

Referências Bibliográficas
Winnicott, D. W. (1965a). A Família e o Desenvolvimento Individual. Belo Horizonte: Interlivros, 1980.

Winnicott, D. W. (1965b). O ambiente e os processos de maturação: estudos sobre a teoria do desenvolvimento emocional. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.

Anotações em aulas do curso de especialização em adolescência da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (1999-2000), ministrado por Marília de Freitas Maakaroun





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