quinta-feira, 17 de maio de 2012


EDUCAÇÃO FAMILIAR

O mundo com suas formas de modernidade vem passando por transformações profundas e velozes que provocam mudanças no comportamento do sujeito e da sociedade. Algumas alterações são visíveis como a precocidade da puberdade, a adoção de novas configurações parentais, mudanças nos papéis sociais, a dificuldade dos membros da família compartilharem o dia a dia entre-si, a supremacia da estética sobre a ética, a valorização do relativismo absoluto, a banalização da sexualidade e da violência, a acentuação da urbanização, a promoção do afastamento entre as gerações e parentescos, e outras. Tudo isso ou grande parte desses fatores podem ter influências no que concerne a formação da família e a educação dos filhos.

Devemos nos lembrar, ainda, que existem diferentes famílias de variadas realidades sociais e que para se discutir essas famílias, necessário se faz contextualizá-las diante das constantes mudanças culturais e sociais.

Não se deve pensar em família enquanto estruturada/desestruturada, o que remeteria a um padrão e qualquer desvio desse padrão configuraria numa crise ou desestabilização, o que geraria novas regras de relacionamento no sistema familiar. A família está sujeita a mudanças decorrentes do tempo e do espaço, já que sofre influencias políticas, econômicas e sociais, o que requerem uma reorganização e uma revisão da família e da sociedade, de suas funções e valores.
A “desacralização”  da família deve ser revista e discutida nas várias circunstancias.



A família é constituída por um grupo de pessoas vinculadas por relações de afetos e solidariedade, com laços de parentesco consanguíneo ou não e que procuram manter a continuidade enquanto grupo e desenvolvam um sentimento de pertencimento. Há de se considerar também que a família abriga um lugar de conflitos e problemas.  Espera-se que os membros da família busquem reconhecer seus próprios recursos e necessidades, bem como resistam às tensões, confrontos e conflitos, com o propósito de solucionar as questões que se apresentam para manter sua configuração. A família serve de apoio e proteção para o individuo, contribuindo para o seu desenvolvimento emocional e construção da identidade. É o lugar da aquisição da linguagem e dos valores sociais.

Ocorre, porém, que diante da crise social que afeta todo o pais, atribuem-se à família a degradação dos valores, a delinquência juvenil, o aumento do consumo das drogas, etc.

As regras familiares se organizam segundo as diferentes sociedades e culturas, ao mesmo tempo que organizam a sociedade e a cultura. Desta forma, as regras que caracterizam a organização familiar refletem o sistema social.  Definições do modo que devem ser a proteção e o cuidado de seus membros, principalmente das crianças e dos jovens, a organização da hierarquia e do poder, as relações de autoridade, a divisão do trabalho para a manutenção e sobrevivência do grupo, a vivencia da sexualidade e da afetividade e as relações entre parentes e outros valores e conceitos são estabelecidos dentro da família. Por outro lado, a família é atravessada por outras instituições (igreja, estado, especialistas e outros) que confirmam ou contradizem os valores da sociedade, produzindo mudanças, apresentando diferenças, acionando a realidade social e ditando receitas sobre como educar os filhos.  A mídia, onipresente, cria modelos a serem copiados e dita o que se deve transmitir aos filhos, e sabe-se que o incentivo dos valores e padrões de comportamento não é, neste caso, dos mais conservadores.

A família detém ainda hoje algum grau de influencia na formação das futuras gerações e um papel relevante no nucleamento dos laços sociais. Segundo, Kehel (2003), “a família mudou, mudaram os papéis familiares, mas não foi substituída por outra forma de organização molecular”. “Ele é como um pai...” Eles são como irmãos...” - são os termos que se utilizam para referenciar uma qualidade usando-se como matriz de valores a família. Apesar de a família ainda ser modelo de agrupamento afetivo, a busca por grupo de amigos traduz a necessidade do jovem buscar fora de casa o espaço para afirmar a diferenciação que instrumente a sua autonomia em relação à geração anterior. No Brasil a procura dos amigos se firma na procura  daqueles que compartilham os melhores valores da sua família. O distanciamento do jovem em relação aos seus vínculos familiares favorece para que o jovem faça seu caminho a partir daquilo que dos familiares foi herdado e que agora se atualiza na construção de novos ideais. O jovem se sente mais “em casa” quando está “fora de casa”.

O filho é produto do seu tempo e do seu meio social. A autoridade, hoje abrandada pela distribuição igualitária do poder, inicialmente entre os pais e atualmente também entre pais e filhos.  Isso deveu-se, é claro, à emancipação financeira dos outros membros da família. É interessante notar que à medida que o “chefe da família” não era mais o único provedor material, a autoridade desloca-se dessa figura e se organiza numa outra “hierarquia”. Nesse sentido, mesmo nas organizações empresariais a autoridade está menos “autoritária” e mais democrática e é com esse modelo de funcionamento que os filhos lidam, tanto na família como nas instituições sociais.

Outra questão que se coloca é o surgimento de laços fraternos mais sólidos que os laços paternos, Na aliança entre os irmãos, a cumplicidade e o afeto ganham mais espaço à medida que os afetos entre pai e mãe são temporários e situacionais, podendo ser transformandos de amor em ódio e os laços rompidos a qualquer momento. Os irmãos se unem para não se sentirem desamparados.

Maior agravo ainda, se dá quando pais, adultos (para não culpabilizar pais adolescentes), não amadureceram suficientemente a ponto de serem referencias adultas para seus filhos. Delegam para a escola, para outros familiares (avós por exemplo) ou para a sociedade (leia-se conselho tutelar, psicólogos ou outros especialistas), a tarefa de educar seus filhos. São coniventes, quando não inconvenientes, deixando de orientá-los e servir-lhes de exemplo no que tange à moral e aos valores, deixando-os de fato, desamparados e fragilizados. Fugir à responsabilidade de se haver com as decisões que precisam tomar frente às necessidades ou aos limites que deveriam estabelecer para seus  filhos é deixá-los ao abandono moral.

Assim, podemos constatar que concomitante ao desamparo moral a que vive o jovem brasileiro, também o desamparo material e simbólico os coloca na condição de delinquentes impedindo-os de dar conta da crise ética e construir novas referências.


Texto elaborado como suporte para entrevista ao vivo em que a autora se apresentou na TV Assembléia, dia 16/05/2012, programa Panorama.



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