sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Trabalho: uma perspectiva de saúde mental para o adolescente


Work: a perspective of mental health for the adolescent

Adriana C. Olimpio[1], Marília de F. Maakaroun[2]

 Resumo:

 A atividade de trabalhar é fundamental para a construção da identidade psíquica do sujeito. O trabalho, comumente, é um espaço onde o sujeito pode expressar sua criatividade, seu sentimento de produtividade e pertencimento, contribuindo, dessa forma, para a construção de vínculos sociais. O trabalho é natural ao homem e é determinante na subjetividade e cultura humana.  A adolescência, por suas características peculiares quanto a mudanças do ponto de vista biológico, psíquico e social necessita de atividades produtivas como a arte, o trabalho e outras, para a construção da sua identidade.  Neste sentido, o trabalho, especialmente para o adolescente, promove um sentimento de produtividade, autonomia e inserção social, resultando no aumento da sua auto-estima e da auto-confiança. Este artigo, na sua primeira etapa aborda de forma sucinta a história do trabalho humano. Em seguida, são tratadas teorias diversas que sintetizam sobre o desenvolvimento psíquico da adolescência e a importância do trabalho para esse desenvolvimento. Acredita-se que, discorrendo sobre as várias dimensões da atividade de trabalhar, sobre a adolescência e sobre a importância do trabalho para o adolescente como possibilidade de proteção e resiliência, possa despertar o interesse de profissionais que lidam com adolescentes sobre esse tema.

 Palavras chave: trabalho, adolescência, identidade, sublimação.

Abstract:

The activity to work is basic for the construction of the psychic identity of the citizen. The work, comumente is a space where the citizen can express its creativity, its feeling of productivity and belonging, contributing, of this form, for the construction of social bonds. The work is natural to the man and is determinative in the subjectivity and culture human being. The adolescence, for its peculiar characteristics how much the changes of the biological, psychic and social point of view need productive activities, as art, the work and others for the construction of its identity. In this direction, the work, especially for the adolescent, promotes a feeling of productivity, autonomy and social insertion, resulting in the increase of its auto-esteem and the auto-confidence. The objective of this article is, through bibliographical survey, to discourse on some dimensions of the work, on the adolescence and the importance of the work for the adolescent as possibility of protection and resilience.


Key words: job, adolescence, identity, subliming.


Introdução:


O trabalho é peculiar ao homem, distinguindo-o dos animais. O homem é essencialmente um ser voltado ao prazer, enquanto os animais buscam pura e simplesmente a satisfação dos instintos. É através do trabalho que o homem ajusta as relações humanas, bem como afirma-se perante a natureza, dominando-a e transformando-a de acordo com suas próprias necessidades e desejos.

O trabalho pode ser para o homem, apenas uma forma de prover o seu sustento, exercido através de esforço repetitivo, rotineiro e insuportável ou pode ser tomado como uma idéia de criação, liberdade, transformação, exercido com prazer. Assim, ao longo da História, o trabalho estará circunscrito à cultura e ao significado subjetivo que o sujeito lhe atribui.

Etimologicamente, de acordo com o Dicionário Dicmax Michaelis (2007), a palavra trabalho vem do baixo-latim tripaliu que significa exercício físico ou intelectual pelo qual o homem atua, de acordo com certas normas sociais, sobre uma matéria, a fim de transformá-la e ainda, ocupação em alguma obra ou ministério. Porém, ao longo da história, o trabalho vai tomando um sentido negativo e incorporando outras representações. Assim, na Roma antiga tripalium significa instrumento usado para castigar os escravos.

CHAUI (1999) destaca que o trabalho, na Grécia antiga, era representado por palavras que definiam seus vários sentidos: labor, que tem um sentido de trabalho manual, penoso, muitas vezes doloroso, exercido com o corpo do homem para a sobrevivência, estando condicionado à vontade alheia ou às forças da natureza;  poesis que tem uma significação de trabalho artístico, criativo e o homem pode concebê-lo com liberdade e dar a ele o destino que lhe convier; e ainda práxis, que tem um sentido pragmático e sugere ênfase no pensamento filosófico, na aplicação das idéias e das conseqüências práticas de conceitos, conhecimentos e  da aplicação da palavra.


História do trabalho:


Se remontarmos à pré-história, no paleolítico inferior, através da arqueologia, encontramos a raça Neandertal, com a presença do Homo Faber que fabricava armas e utensílios de pedra. Isso os caracterizava como essencialmente caçadores. Recolhiam pedras com formato de figuras inusitadas, produzidas pela erosão, que lhes estimulavam o instinto estético, mas não possuíam ainda, a capacidade de produzir arte.

No paleolítico superior, quarto período glacial, aparece o homem de CroMagnon e o Homo Sapiens, que habita em cavernas e também constrói choças.  Há o aperfeiçoamento de armas e utensílios líticos com a predominância ainda da função da caça.

No período neolítico, mais ou menos 5 mil anos a.C. ocorre uma mudança benéfica no clima terrestre. Em toda a Europa, norte da África até o extremo oriente aparece a presença do homem sedentário. Começa o cultivo dos campos e diminui o nomadismo. Suas atividades se vinculam principalmente aos ciclos naturais das estações. Constroem choças e palafitas em lagos e terrenos pantanosos. Aprendem a domesticar os animais e a modelar a cerâmica e a arquitetura.  Nessa época não faziam distinção valorizando mais uma atividade que outra, logo não havia nenhuma valoração do trabalho ou do trabalhador.

No eneolítico, que inicia-se mais ou menos no ano 3.000 a.C e finda aproximadamente no  ano 200 a.C., também chamada a idade do metal, é que aparecem as civilizações históricas do mundo. O homem começa a manipular metais como cobre, bronze e ferro para a fabricação de utensílios domésticos e armas. Empregam esses mesmos metais associados a madeira, barro e pedra para a construção de habitações. Iniciam a fundição de ouro e bronze como arte decorativa e ornamental com simbolizações de conceitos, coisas e seres para recobrir objetos e armas. São criadas rotas para comércio de estanho e âmbar. No Egito, são erguidos monumentos gigantescos com inscrições e relevos mitológicos, cujo significado imbrica-se com a religião, a arte, a cultura. Nessa era já existe uma organização política e hierárquica, com castas sacerdotais e faraônicas e a presença de trabalhadores: artesãos, escribas, dançarinas, criados e escravos.

No Egito já aparece o conceito do trabalho como desonra e como pena que cabe aos escravos e aos pobres. (CHAUI, 1999, p.11).

Na Grécia e Roma antiga é introduzido a separação entre poiésis, que é o  trabalho mental, teórico  e a práxis, que se expressa como ação do trabalhador comum, que mesmo sendo habitante da cidade seu trabalho era fruto muito mais da técnica do que do pensamento, e ainda os escravos  que não recebiam o título e as honras do cidadão, não podiam participar das decisões políticas, estavam sempre subordinados às ordens de seus senhores e eram considerados bens materiais e tratados como "coisas". Na Grécia e Roma antiga, o trabalho era um mal físico que embrutecia o espírito ao qual os indivíduos de maior valor não deveriam submeter-se.

Na Idade Média, a princípio o trabalho era doméstico, destinava-se a atender às necessidades da família do camponês e era realizada inicialmente no seio das próprias famílias onde várias gerações coabitavam. Mas, foi ainda na Idade Média que a produção começou a ser feita fora dos círculos familiares e organizou-se economicamente sob o critério de corporações – associações de produtores semelhantes aos sindicatos patronais de hoje.

Nessa época, boa parte do ocidente era dominada pelos pressupostos do cristianismo que pregavam que além do caráter de expiação do pecado, o trabalho também ajudava o homem a livrar-se dos seus maus pensamentos. Para Lutero, o trabalho passa a ser um modo de servir a Deus, tornando-se o caminho religioso da salvação. Calvino retoma a idéia do trabalho como necessidade de uma ação racional e metódica sobre o mundo, idéia que prevalece até os dias de hoje.

No sec. XIX o trabalho passa a ter significado utilitarista. Apareceram na Europa as primeiras leis que reconheciam e proclamavam os direitos dos trabalhadores. Os primeiros sindicatos operários foram criados na Inglaterra em 1824. Crianças e adolescentes trabalhavam nas fábricas. NASCIMENTO (2005, p.924) assinala que, como medida protetora de trabalho excessivo ou insalubre que ocorria em todos os países industrializados, no ano de 1802 Robert Peel, ministro inglês realizou um manifesto tendo como lema "salvemos os menores". Ocorria que crianças e adolescentes eram expostos a trabalhos forçados, sem o mínimo cuidado quanto ao desenvolvimento saudável dos mesmos, seja em relação aos aspectos físicos, sociais e psicológicos.  É dessa época que iniciaram-se os manifestos contra a exploração do trabalho infantil.

História do trabalho no Brasil



O Brasil, no período colonial ficou submetido ao regime jurídico da lei portuguesa. Em 1824 a Constituição Imperial limitou-se a assegurar a liberdade ao trabalho como direito inalienável do homem, mantendo escravizada quase metade da população brasileira. Porém o trabalho não era livre na realidade, visto que até 1888 o trabalho escravo foi o esteio da produção agrícola que era praticamente a única produção brasileira.

Atualmente o Brasil, dentre os países da América do Sul, ocupa posição de realce em relação à preocupação com as leis do trabalho, tendo o seu primeiro Congresso Operário Brasileiro realizado em 1906. No entanto, no final do século XIX e início do século XX, as condições de trabalho eram muito precárias: os operários eram submetidos, em geral, a jornadas de 16 horas diárias, e a semana consistia em seis e até sete dias de trabalho.

A reforma constitucional de 07 de setembro de 1926 auferiu ao Congresso nacional ditar as condições para o trabalho, através de normas jurídicas. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), foi anunciada em 1° de maio de 1943.

A Constituição da República Federativa do Brasil (Constituição Federal) de 05/10/1988 promulga os direitos e proteção especial dos menores: idade mínima de 14 anos para admissão ao trabalho com garantia de direitos previdenciais trabalhistas e acesso do adolescente à escola. Proíbe  trabalho noturno, perigoso e insalubre a menores de 18 anos.

Em 16/12/1998, com a Emenda Constitucional nº 20 houve aumento da idade mínima no trabalho para 16 anos, admitindo a aprendizagem a partir de 14. O aprendiz é um empregado que tem direitos trabalhistas e previdenciários. Tem direito a ½ salário mínimo na primeira metade da aprendizagem e 2/3 na segunda. É obrigado, enquanto trabalha a freqüentar o ensino regular.

A lei 7854 de 24/10/1989 promulga a adoção de legislação que disciplina o mercado de trabalho em favor de pessoas com deficiência física. Somente após o decreto nº 3298 em 20/12/1999,  artigo 36,  a empresa com 100 ou mais funcionários é obrigada a preencher de 2 a 5% de seus cargos com portadores de deficiência física.


Discussões teóricas acerca do trabalho:


Filosoficamente, conceitos diversificados do trabalho são defendidos por alguns teóricos. Conceitos esses, muitas vezes dicotômicos e conflitantes.  Por um lado, as concepções idealistas preocupam-se com o trabalho como possibilidade de transformação e desenvolvimento do ser humano, enquanto as concepções materialistas visam o nível socializante e humanizante do trabalho. Tais efeitos se perdem  à medida que o trabalhador é submetido ao sistema capitalista e sua força de trabalho é vendida para a garantia da sua sobrevivência, sem possibilitar ao trabalhador refletir sobre suas ações ou mesmo escolhê-las.


Como representante da concepção idealista conclamamos LUCKÁKS (1979), que concebe o trabalho como atividade essencialmente humana. Ele observa que na ação instintiva dos animais não se compara às ações dos homens que se orientam de forma consciente. O homem é aquele ser capaz de construir sua própria história e fazer-se através do seu trabalho, sendo portanto, mutável, dinâmico, em processo de construção e reconstrução. Para Luckás, dentre as atividades que os homens realizam em sociedade e que interferem diretamente sobre sua existência, nenhuma pode ser considerada tão importante quanto o trabalho, pois é através do trabalho que o homem pode intervir no mundo. Foi entorno do trabalho que as sociedades mais simples se organizaram demonstrando que o trabalho foi essencial para se estabelecer a vida em grupo. Ele afirma que as outras formas do humano se apresentar, como a linguagem, a arte e outros meios de significar e representar o mundo só se tornarão possíveis a partir de realizações diretas, mediatizadas pelo trabalho, o que lhe confere uma importância singular.  

Mas, mesmo que pelo trabalho os homens se distinguem dos animais ao pressupor uma consciência repleta de decisões e escolhas, ainda assim, muitas vezes o homem se coisifica, afastando-se da condição de sujeito. É que o sistema social pela produção de objetos construídos pelos homens passa a adquirir vida própria e impõe regras ao homem, eliminando suas possibilidades de escolha.

 

Assim, MARX (1896-94), observando e refletindo sobre a condição concreta da vida dos trabalhadores do seu tempo, concebeu o trabalho como atividade inseparável do próprio desenvolvimento humano e também destacou a alienação do homem reduzido à condição de mercadoria. Para ele, o ser humano é constituído pela sua capacidade de produzir e pelo modo que ele utiliza dessa capacidade.  Marx denuncia a distorção do trabalho na sociedade capitalista que coincide com a própria deformação do homem, ao que ele chamou de alienação.

DEJOURS (1988) encontrou nas organizações trabalhadores adoecidos e designou a psicopatologia do trabalho como os fenômenos psíquicos que acontecem com o trabalhador que se adapta forçosamente ao ritmo da tarefa mecânica, repetitiva e automatizada. Este tipo de  atividade produz no trabalhador um pensamento desafetado, repetitivo, estereotipado, alienado e reprimido. Cabe às organizações considerarem não mais somente a produtividade, mas também a saúde do trabalhador, buscando alternativas para suprimirem esses efeitos patológicos. Mas DEJOURS (1986,1992) também reconhece o trabalho como fonte de saúde para o desenvolvimento psíquico do sujeito. Ele afirma que “ [...] quando as pessoas não fazem nada e podem manter-se num estado de inatividade total, é sinal de que estão muito doentes”. (DEJOURS, 1986, p.10). Seu pensamento coincide com o pensamento freudiano, que enfatiza que o trabalho serve como um mecanismo de deslocamento das pulsões sexuais para atividades valorizadas socialmente, o que caracterizaria a sublimação dos instintos.


FREUD (1908-1913-1930) declara que dois mecanismos atuam no homem desde a mais tenra infância: o princípio do prazer e o princípio de realidade. O princípio do prazer busca a satisfação de todos os impulsos e desejos, gerando, justamente por causa dessa busca incessante de satisfação, o sofrimento. Já o princípio de realidade é um mecanismo que gera motivação e prazer, justamente por dar um limite ao impulso desenfreado do princípio do prazer, fortalecendo assim a identidade e todos os elementos psíquicos do sujeito. O mecanismo de realidade  aproxima o sujeito do prazer, uma vez que  possibilita a subversão do sofrimento gerado pela busca incessante do prazer, através da sublimação. A sublimação, então, é uma forma de extravasar através de produções socialmente aceitas, a energia libidinal contida pelo princípio de realidade.

A sublimação pode existir em qualquer atividade humana que conduza a transformação de pulsões sexuais em uma ação construtiva. Desta forma, o uso do conceito de sublimação ajusta-se perfeitamente para a atividade do trabalho.

Se para a saúde do homem, por um lado, a psicanálise enfatiza a necessidade de sublimação, o marxismo enfatiza a necessidade de uma atividade construtiva e não alienante.  Essas visões não são antagônicas pois o trabalho criativo e não sistematizado é uma das fontes de saúde e fundamental para o desenvolvimento psíquico do sujeito. Daí consideramos que o trabalho é natural ao homem e é determinante na subjetividade e cultura humana, necessária também, ao adolescente.

 

Trabalho e adolescência:

 

Na realidade brasileira, o adolescente ingressa no mercado de trabalho por imposição das necessidades materiais vivenciadas por ele e sua família e não como uma das formas de potencialização do desenvolvimento psíquico e social. Ao trabalhador é exigida certa maturidade psicológica para lidar com autoridade, responsabilidade, relações interpessoais, cumprir regras e uso do tempo. Essas são questões extrínsecas ao produto do trabalho, mas fazem parte do ato de trabalhar. Tanto que, quando se fala em adaptação ou em não adaptação ao trabalho, incluem-se aí tanto a relação com a tarefa propriamente dita quanto a relação com o ambiente, isto é, com os outros.

O adolescente, muitas vezes não sabe lidar com essas questões, porque ainda não está preparado psicologicamente ou organicamente para tal. Destaque-se que a adolescência se caracteriza por uma série de mudanças, tanto do ponto de vista biológico quanto psicológico, com passagem da vida infantil para vida adulta e também de um estado de dependência para um de relativa autonomia.

As mudanças físicas que se processam no corpo do adolescente se fazem de forma rápida e intensa. A construção da identidade psíquica, que se inicia na infância e se consolida na adolescência juntamente com a auto-imagem, tem que ser reformulada: agora já não está presente mais um corpo infantil ou a identidade infantil.  A identidade juntamente com a auto-imagem é a possibilidade do adolescente se ver ao longo da sua história, integrando passado e presente e se projetando no futuro.  A identidade é a combinação de características da personalidade e estilo social, pela qual o indivíduo se define e é reconhecido. É nessa fase de transição que ocorre o amadurecimento psíquico do sujeito possibilitando-o inserir-se na vida adulta.

O trabalho em todas as classes sociais promove responsabilidade, sentimento de ser útil, apreciação do valor do dinheiro, da educação e aspirações ocupacionais elevadas. Podemos dizer que atividades produtivas, como o trabalho, a arte e outras têm importância fundamental para que o sujeito desenvolva e construa a sua identidade. Para o adolescente, a produtividade é a possibilidade de contribuir, de realizar algo e criar alternativas e soluções às problemáticas que se apresentam para a criação de um mundo mais habitável e mais justo.

O impacto do trabalho do jovem depende da natureza dessa experiência: o trabalho dirigido ao adolescente, desde que dê a ele certa autonomia, tem resultados positivos, aumentando a auto-estima do jovem, a auto-confiança e o envolvimento com a sua produtividade. Trabalhar diminui a ansiedade e o sentimento de insegurança além de oferecer valores ocupacionais e sociais intrínsecos. Para os adolescentes de classes menos privilegiadas, o trabalho freqüentemente é um meio de adquirir habilidades e contatos que podem ser valiosos para o seu futuro.

É fato que um adolescente engajado em uma atividade produtiva, seja ela voluntária ou não, se beneficiará com o resultado desse amadurecimento. O que se percebe é que esse jovem por este amadurecimento é mais resistente às drogas, a violência e a uma gravidez não planejada. SIQUEIRA (1987), no seu livro Liturgia do Amor Maior, referindo-se ao trabalho para menores diz que o "Trabalho é um estímulo constante para afastar a ociosidade que amesquinha e gera todos os vícios".

 

Porém, existe um debate constante, sobre benefícios e custos do trabalho do jovem. Os argumentos do lado negativo, entre outros, são: o adolescente terá de adquirir prematuramente; terá menos tempo de lazer; freqüentemente não tem um adulto responsável para seu monitoramento no trabalho. Vários estudos mostram que longas horas de trabalho diminuem o envolvimento com a escola levando a piores resultados acadêmicos.

A proibição do trabalho noturno, perigoso ou insalubre também se relaciona com a proteção a saúde do adolescente. Cabe a sociedade de forma geral a implementação de políticas públicas que assegurem a saúde do adolescente e compensem essas desvantagens.

Assim, a criação de oportunidades de trabalho para os adolescentes, voltadas para as intervenções sociais nos problemas que marcam a sociedade brasileira devem ser levadas em consideração na elaboração de políticas públicas e de ações educativas, dada sua importância para a construção de uma sociedade mais solidária, a consolidação da democracia e o fortalecimento da cidadania.

Entre as várias intervenções protetoras e de resiliência que levam ao sucesso, uma delas, muito importante, é prover habilidades para a vida: envolver ativamente os jovens e profissionalizá-los.

 

Conclusão:

 

Desde que MARX (1844), escreveu os "Manuscritos econômicos-filosóficos", conhecidos como seus escritos da juventude, o estudo do trabalho e sua forma de organização tornaram-se decisivos para uma nova compreensão do homem como artífice da cultura e da história.  

Se levarmos em consideração a proporção da população jovem que hoje chega a cerca de 1,2 bilhões de jovens, os países em desenvolvimento que reúnem 85% da população mundial, necessitam de um projeto de vida para os jovens.  As nações Unidas, em 1985, em comemoração ao Ano Internacional da Juventude, produziu um documento que estabelece orientações para que os países construam bases para uma política de juventude e que reconhece que os jovens são uma força positiva e têm enorme potencial para contribuir para o desenvolvimento e progresso social.

 

Na redação da Emenda Constitucional nº 20/98, o artigo 7o, XXXIII, cuida especificamente da proteção à saúde do adolescente trabalhador; determinando a "proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho aos menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos".

O trabalho como atividade eminentemente humana pressupõe que quem o exerce ultrapassou as etapas necessárias à sua consolidação psíquica e apresenta-se como quem pode oferecer sua força de trabalho.

Se pensarmos o trabalho pela via da escolha, iremos concluir que na verdade ele é para a maioria dos adolescentes brasileiros mais uma contingência do que uma escolha, e mais ainda, não é uma escolha livre, porque há leis e regras para escolher e há limites e níveis de escolha. A maioria dos jovens brasileiros terão que aprender a viver em um mundo globalizado, dominado pela tecnologia e informática e terão ainda que sobreviver a pobreza, a falta de acesso a uma educação de qualidade e a exclusão social, impeditivos estes para as oportunidades de trabalho saudáveis e bem remuneradas neste início de século.


Por isso é que o trabalho pode, ao mesmo tempo, possibilitar a vida, mas também o desgaste e o adoecimento.

Neste século, as possibilidades de participação social, e especialmente, de acesso a emprego estarão cada vez mais dependentes do domínio do conhecimento científico e tecnológico disponível. A prática da solidariedade e da cooperação, o exercício da cidadania plena e a garantia de ampliação dos direitos básicos exigem mudanças profundas de atitudes e valores, para que a juventude supere os obstáculos ao seu desenvolvimento pleno. O trabalho é uma das formas de participação social e engendra novas articulações nas relações de poder.  É pelo trabalho que o jovem irá integrar-se nos processos coletivos, aumentar sua auto-estima e tornar-se sujeito de sua própria história.

Nós, profissionais que estamos envolvidos com os adolescentes, devemos estimular à procura, a profissionalização, a adaptação para o trabalho em todas as classes sociais e, respeitando e conhecendo a individualidade de cada jovem, orientá-los para a construção de um mundo mais solidário para hoje e para as futuras gerações.

Referências Bibliográficas:


Boletim de Novidades Pulsional, ano X, no. 100, agosto de 1997 – O mal-estar no trabalho, Flávio Carvalho Ferraz.

CHAUÍ, Marilena. Introdução. IN: LAFARGUE, Paul. O direito à preguiça. São Paulo: Hucitec; Unesp, 1999; p.12

DEJOURS Christophe, Abdoucheli E. Itinerário teórico em psicopatologia do trabalho. In:  Dejours C, Abdoucheli E, Jayet C, organizadores. Psicodinâmica do trabalho. São Paulo:  Atlas.

_________. Loucura do trabalho. São Paulo: Oboré; 1987.

FREUD. As Pulsões e suas Vicissitudes.

_____ O mal estar na civilização.

HOBSBAWM, Eric J. A Era do Capital (1848-1875). 9ª edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996;

__________________. Os trabalhadores. Estudos sobre a História do Operariado. 2ª edição. São Paulo: Paz & Terra, 2000;

LUKÁCS, G. Os princípios ontológicos fundamentais de Marx. Cap.IV da Ontologia do ser social. Trad. de  Carlos Nelson Coutinho. São Paulo: Livraria de Ciência Humanas, 1979. p. 12 

MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos e outros textos escolhidos. 5 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991;

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 20ed. São Paulo: Saraiva, 2005. 1221 p.

PAIS, Marco Antonio de Oliveira. O Despertar da Europa: a Baixa Idade Média. 12ª. Edição. Atual 24 

SIQUEIRA, Liborni. Liturgia do Amor Maior. Ed. Liber Juris, 1987. 89p.



[1] Graduada em História, mestre em Educação, professora de história do ensino fundamental da Escola Estadual Melo Viana.
 
[2] Doutora em Medicina do Adolescente, Professora do Departamento de Pedriatria da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais.

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