quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

A MÚSICA NAS INTERAÇÕES HUMANAS (3a parte)


2.3 A música e o meio 

A música pode não ser uma invenção humana, é algo inato à natureza. No entanto, a criação musical sim é uma invenção humana. Somente os seres humanos são capazes de criar música que,  como  produto  da  cultura  e  está  interligada  ao  processo  dinâmico  e  energético  no universo. Como tal, a música proporciona condições para reflexão ao mesmo tempo em que promove a mediação entre os indivíduos e este meio.  

O ambiente, como visto no capítulo anterior, é constituído pelos seres vivos nele inseridos que interrelacionam-se, como sugere Tomatis e Vilain (1991, p. 114-5): 

O  ambiente  não  cessa  de  revelar  ao  homem  sua  pertinência  a  este  grande 
todo vibrante que se manifesta fora e dentro de cada ser humano, passando 
de um para outro, unindo num jogo permanente o finito da natureza humana 
e o infinito imóvel, limite de nossa concepção de mundo.  

Ao  interagir  no  meio  com  sua  frequência  vibracional,  como  sugere  Jenny  (1967),  as  ondas sonoras, independem da percepção ou até mesmo da audição de quem ou do que está exposto a  ela.  Mesmo  assim,  a  música  interage  com  as  unidades  celulares  ou  atômicas,  podendo modificar suas estruturas, de acordo com o tipo de vibração a ela exposto.  Para o autor, várias substâncias,  principalmente  as  líquidas,  são  bastante  susceptíveis  às  transformações.  Vale lembrar,  então,  que  o  corpo  humano,  na  fase  adulta,  como  postula  Macêdo  (2004),  é constituído de 70 à 74% de água.  Petráglia (2008) acredita que  a música pode atuar tanto no nível da matéria com suas ondas vibratórias em organismos e objetos, num caráter estrutural, quanto em processos cognitivos, acompanhados pelas sensações, percepções e emoções. 


Ao  interagir  com  o  meio  através  do  seu  conteúdo  simbólico,  a  música  deixa  aflorar  todo o conteúdo subjetivo de seus interpretantes, ou seja, seu potencial interpretativo. Para que este potencial passe a significar algo é necessário o processo cognitivo.  

Assim a  música, por seu conteúdo significante comunica tanto com quem  a produz, quanto com quem a ouve. Desse modo, a música atua junto aos afetos, possibilitando emergir novas maneiras  de  significação  do  indivíduo  frente  ao  seu  meio  (WAZLAWICK;  CAMARGO; MAHEIRIE, 2007). Ou seja, a música é capaz de atuar na subjetividade daquele que a ouve fazendo com que a sua relação com o seu meio se altere. Também, Castro (2007) afirma que o contato com a música é uma interação ser vivo/meio ambiente e que a possibilidade de escutar é algo que traz o ambiente para dentro do ser e o posiciona diante dele. 

Dentro deste contexto, a música tem a capacidade de atuar na extensa e complexa rede em que o  homem  é  apenas  mais  um  de  seus  constituintes.  Aí,  estabelece  um  diálogo  entre  seus componentes dentro de um processo sígnico, reformulando e reconfigurando a ecologia em que o homem é sujeito e objeto. 

É de modo emocionado que o sujeito constrói os significados da música, em sua  vivência, 
a  partir  de  seus  sentidos,  objetivando  sua  subjetividade, tornando-a  “audível”  para
ele  e  para  os  outros.  Os  significados  e  sentidos ressoam  nas  vivências  do  sujeito
são  construídos  na  sua  relação  com  a música.   
Estes   significados   partem   das   vivências   afetivas   do   sujeito, 
demonstrando   a   utilização   viva   da   música,   uma   vez   que   mudam, 
desconstroem-se  e  são  recriados,  porque  também  são  constituídos  pelos 
sentidos,  ligados  ao  uso  da  música  de  modo  idiossincrático  e  em  relação. 
(WAZLAWICK; CAMARGO; MAHEIRIE, 2007, p. 112). 

Música,  inserida  em  um  meio,  pode  favorecer  ou  não  este  ambiente.  Conforme  pesquisado por Petráglia (2008), em termos vibracionais, músicas eruditas, como as de Bach, podem ser  favoráveis a organismos vivos, como as plantas, enquanto que as musicas ruidosas, do estilo Acid Rock de Jimi Hendrix e Led Zeplin, podem ser desfavoráveis a estes organismos. Por sua  vez,  em  termos  simbólicos,  as  sensações  e  emoções  pessoais  permitem  construir significados na música ou mesmo resignificá-la, assim como a cada vivência do sujeito que entra  em  contato  com  ela.  Além  disso,  numa  dimensão  sócio  cultural  a  música  possibilita aflorar de  modo objetivo, a própria subjetividade, como nos sugere  Wazlawick,  Camargo e Maheirie (2007). 

Este  contexto  último,  o  sócio  cultural,  é  a  dimensão  espaço  temporal  do  meio  em  que  a música se concretiza. Nesse sentido, a música tem estado presente em vários ambientes e com as mais variadas funções. Independente do tempo e de sua aplicação, sua função primordial se resumem em “afetar”, não só aquele que a ouve, mas também quem a faz e o contexto em que se desenvolve. Assim, independente se a música se apresente naqueles lugares “normalmente” eleitos  como  espaços  apropriados  para  ela,  como  teatros,  salas  de  concertos, templos  etc,  e independente da intenção, ela está apta a afetar. 
  
Segundo  as  ideias  de  Shaffer  (1991),  todo  ambiente  tem  sua  particularidade  sonora,  sua paisagem  sonora 9 .  Assim  é comum  se  imaginar cânticos de  louvor em  igrejas evangélicas, gritos em brinquedos como montanhas russas e buzinas no trânsito, mesmo que estes sejam apenas  parte  do  complexo  sonoro  que  compõe  cada  um  desses  ambientes,  dando-lhes  uma identidade própria. E como afirma Schafer (1991), os sons da paisagem sonora, em especial os  sons  fundamentais  de  uma  cultura,  influenciam  o  comportamento  de  um  grupo  social. Portanto,  qualquer  som  introduzido  num  dado  ambiente,  estará  interferindo  na  paisagem sonora  deste  mesmo  ambiente.  Nesse  sentido,  uma  música  introduzida  num  ambiente “estranho” a ela, pode interferir num meio, modificando-o. A presença de uma música pode modificar essa paisagem e por consequencia, pode proporcionar ao meio e a seus integrantes, uma nova perspectiva deste ambiente.  

É  neste  sentido  que  a  música  pode  e  tem  estado  inserida  nos  mais  diversos  ambientes  e 
afetando-os. É de um destes ambientes, que tratará o próximo capítulo. 
  
                                                 
9   Paisagem Sonora “é constituída de ruído, som, timbre, amplitude, melodia, textura que se encontram num cone de tensões, instalado num horizonte acústico”. Como por exemplo,“uma composição musical é uma viagem de ida e volta através desse cone de tensões [....] Cada peça de música é uma paisagem sonora elaborada, que pode ser delineada no espaço acústico tridimensional” (SCHAFER, 1991, p. 78). 

2 comentários:

  1. Obrigada Augusto. Você leu a 1a e 2a partes? O que se percebe é que a música pode mudar o humor das pessoas, contribuindo para a sua saúde ou para o seu estresse. Boas leituras!

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