Para preservar identidade da adolescente, iniciais do nome, data, horários e resultados de exames foram omitidos.
RELATO DE CASO: GRAVIDEZ AOS 11 ANOS
Maternidade Hilda
Brandão – Serviço Dr. Sinval Ferreira de Oliveira
Adriana Biagioni de
Almeida Magalhães Carneiro, Cristina Maria Abud Seabra Matos
Agradecimentos aos
professores Mário Dias Corrâ e José Mariano Sales Alves Jr.
RESUMO
O presente artigo relata um caso
de gravidez em uma adolescente de 11 anos, na qual não ocorrera menarca,
colocando em discussão as implicações materno fetais da gravidez na
adolescência.
Palavras chave: gravidez na adolescência.
Segundo a OMS, a adolescência é
definida cronologicamente pela faixa etária dos 10 aos 20 anos. Corresponde a
uma fase do desenvolvimento humano que representa a transição entre a infância
e o estado adulto, caracterizada por um conjunto de transformações biológicas e
psicossociais. Ao processo de maturação biológica dá-se o nome de puberdade,
período no qual irão se desenvolver os caracteres sexuais secundários. A menarca
é um dos principais acontecimentos dessa fase, inicialmente com ciclos
predominantemente anovulatórios, porém já sendo biologicamente possível a
ocorrência da gravidez.
A gravidez na adolescência sempre
existiu e traz consigo riscos biopsicossociais importantes. O aumento de sua
incidência é reflexo de uma série de mudanças nos padrões culturais, da idade
da menarca mais precoce e das influências sociais dos meios de comunicação que
estimulam cada vez mais cedo a iniciação sexual.
As adolescentes grávidas vivenciam
ao mesmo tempo o luto pela perda do corpo infantil e as transformações de um
corpo adolescente modificado pela gravidez.
Sob o ponto de vista médico,
trata-se de uma gestação de alto risco, considerando-se não apenas a idade
cronológica da gestante, mas também sua idade ginecológica, condições
econômicas, sociais, culturais e o tipo de assistência médica recebida.
RELATO DE CASO
DSS, 11 anos, feminino, natural e
procedente de Belo Horizonte, estudante (5ª série do 1º grau), solteira,
faioderma, primigesta (Idade Gestacional (IG): 38/39 semanas).
Paciente informa início da
atividade sexual aos 10 anos de idade, com parceiro único (13 anos de idade,
estudante, primo da mesma), sem o uso de quaisquer métodos anticoncepcionais.
Não houve relato de abuso sexual. Devido à falta de informação, a mesma
desconhecia a possibilidade de uma gravidez.
Ao notar aumento do volume
abdominal e edema de membros inferiores, foi levada a um hospital local, sendo
solicitado ultra-som abdominal que diagnosticou gestação de 20 semanas. Não foi
possível calcular a idade cronológica da gestação devido à ausência de menarca.
Realizou 5 consultas de pré natal
na Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte, com evolução sendo observado
apenas corrimento amarelo bolhoso, sem odor fétido, tratado com metronidazol
tópico (IG 32/33 semanas). ... Negava etilismo, tabagismo ou uso de drogas.
Procurou a Maternidade Hilda
Brandão da Santa Casa de BH, onde foi admitida em trabalho de parto (colo 80%
apagado, com 2 cm de dilatação e 4 contrações uterinas com duração de 35”no
período de 10’). Relatava dor abdominal tipo cólica, de intensidade e freqüência
crescentes iniciadas às 1h deste mesmo dia. Negava eliminação de tampão mocoso,
perda de líquido amniótico e sangramento genital. Ao exame físico apresentava
bom estado geral. O útero-fita era de 29cm e o feto encontrava-se em situação
longitudinal, posição direita e apresentação cefálica (pólo cefálico alto e
móvel). Ao exame pélvico, vulva eutrófica, períneo íntegro, vagina elástica e
membranas íntegras.
Evoluiu com 5 contrações uterinas
com duração de 35 a 45”no período de 10’, colo dilatado 4cm e 80% apagado...
Manteve o mesmo padrão de contrações até a manhã do dia segunte, quando o colo
chegou a atingir 9cm de dilatação e 90% de apagamento, com BCF mantendo-se em
140 bpm. Devido ao diagnóstico de desproporção céfalo-pélvica foi realizado
parto transabdominal sob raquianestesia. Feito incisão de Pfananestiel,
abertura por planos, histerotomia segmentar com secundamento manual da
placenta, sem intercorrências.
Retirado o recém-nascido único,
sexo masculino, vivo, com bossa serossanguínea occiptal. O APGAR do 1º minuto
foi de 6 e do 5º minuto foi 9. Apresentava idade gestacional pelo exame físico
de 39,7 semanas, sendo classificado como AIG. As únicas alterações ao 1º exame
foram tremores discretos de extremidades e hipoatividade, sendo solicitados
calcemia, magnesemia glicemia de jejum. Foi realizado glicemia capilar, sendo
prescrito SGH à 10% nos intervalos da amamentação. Nesse mesmo dia (25 horas de
vida), desenvolveu icterícia zona I, a qual evoluiu para zona IV as 52 horas de
vida, sem demais alterações ao exame físico. ... Recebeu alta hospitalar no dia
seguinte (com 2.540g) após tipagem do seu grupo sanguíneo (O positivo) e
determinação de coombs direto (negativo).
A paciente evoluiu no pós-parto
com bom estado geral, sem intercorrências. Recebeu alta hospitalar após
orientações a respeito de planejamento familiar e cuidados com o recém-nascido,
amamentando o mesmo.
DISCUSSÃO
A gravidez na adolescência tem-se
tornado um problema de saúde pública no Brasil, com índices variáveis, conforme
região e condições sócio-econômicas. Na Maternidade Hilda Brandão, em 1998,
foram registrados 2.717 partos, sendo 3,64% em pacientes menores de 16 anos.
Diante dessa realidade, faz-se
necessária a adoção de medidas preventivas que permitam a redução de tais índices.
Tais medidas consistem no esclarecimento da fisiologia da reprodução, educação sexual
e uso adequado de métodos anticoncepcionais (prevenção primária), assistência pré-natal
(prevenção secundária) e pelo acompanhamento da relação mãe-filho (prevenção terciária).
Algumas complicações que podem
surgir no decorrer da gestação ou do parto ocorrem com maior freqüência na
gestante adolescente. Dentre elas destacam-se pré-eclâmpsia, trabalho de parto
prolongado, desproporção feto-pélvica, anemia, hemorragias e infecções. Esses efeitos
desfavoráveis não estão necessariamente relacionados à idade, pois sofrem
grande influencia de fatores ambientais, sociais e médicos.
Em relação ao desenvolvimento da
pelve materna, não há consenso na literatura à respeito da desproporção céfalo-pélvica
e maior incidência de cesárea na gravidez precoce quando comparado aos grupos
controle.
Tais complicações maternas
repercutem sobre o concepto aumentando os índices de prematuridade, malformações
e baixo peso ao nascer. Este último é responsável por uma maior mortalidade
perinatal.
No caso relatado podemos observar
a ocorrência de trabalho de parto prolongado (duração mais de 12 horas),
levando à formaçao de bossa serossanguínea e APGAR baixo no primeiro minuto. Essas
complicações poderiam ter sido evitadas com uma intervenção obstétrica precoce,
principalmente por tratar-se de gestante adolescente e primigesta.
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