sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Depressão, o mal do século.

A tristeza é uma experiência quase cotidiana, juntamente com outros sentimentos como alegria, a esperança, o prazer. Todos os dias somos acometidos por circunstâncias e situações que provocam um misto de sentimentos gerando comportamentos e reações que normalmente atingem o entorno do qual fazemos parte. No entanto, quando sentimentos de tristeza aparecem, as pessoas, amigos e família tendem a negá-los e repeli-los. Não se pode ser infeliz. Mas, nem sempre as pessoas conseguem atender as exigências sociais e se afundam na tristeza de forma a não permitir que outros sentimentos possam emergir. Neste caso, quando a tristeza reina sobre a vida da pessoa, constatamos que ali está presente uma doença, que chamamos de depressão.

Depressão é um termo utilizado para caracterizar tanto um estado afetivo quanto uma doença. A depressão pode ser eminentemente endógena (por disfunção orgânica) ou exógena (decorrente de situações de perdas, frustrações, traumas e estresse), mas na maioria dos casos, a doença resulta da interação entre uma predisposição genética e fatores ambientais, como o estresse e os traumas emocionais.

A depressão apresenta sintomas muito característicos: humor depressivo e/ou falta de interesse e motivação que se arrasta por boa parte do dia, vários dias seguidos. Há tendência em ficar deitado e ao isolamento social e familiar.  O humor também pode ser irritável, manifestado pela tendência a sentir-se facilmente incomodado com tudo, mal-humorado e muito sensível aos estímulos. O deprimido fica indeciso e avalia a si mesmo de forma pessimista e a tudo que o rodeia, distorcendo a realidade. Na maioria das vezes apresenta uma lentificação psicomotora com redução da energia mental e física em graus de intensividade variáveis que se expressa pela dificuldade de levantar pela manha e realizar as tarefas cotidianas. A falta de energia mental se traduz por lentidão de processos psíquicos, com dificuldade de raciocínio, sensação de confusão mental, redução da capacidade de concentração e conseqüente prejuízo da memorização, além de comprometer a capacidade de organização e planejamento.  Não raro, há uma redução ou ausência da capacidade de sentir prazer, alegria, felicidade e há um predomínio preocupação excessiva acompanhadas de sentimentos de inutilidade ou culpa, com pensamentos de morte, ideação suicida ou plano específico de cometer suicídio. Estes sintomas causam sofrimento significativo e prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.

Mesmo após passado longo tempo das perdas significativas (perda do emprego, perda de ente querido, etc), os sintomas persistem, acrescentando-se ainda, insônia terminal, piora dos sintomas especialmente ao amanhecer, diminuição do apetite, perda ou ganho de peso e retardo ou agitação psicomotora  queixas de desânimo, mau humor e infelicidade.

Há formas de depressão grave, nas quais ocorrem sintomas psicóticos (delírios e/ou alucinações). Os delírios comumente são de ruína financeira ou moral, doença, culpa, morte ou aniquilação. Dentre as alterações sensoriais e perceptivas, as alucinações geralmente são auditivas com vozes acusatórias e muitas vezes não passam de sensação de ouvir barulhos na casa ou escutar chamar o nome; podem ser visuais, de conteúdo desagradável ou caracterizar-se por ilusões.

Freud, trata do tema da depressão em toda a sua obra, mas especialmente no seu texto Luto e melancolia (1915), em que apontava  uma distinção entre duas formas de depressão: uma patológica, por ele designado como melancolia, e a tristeza normal, decorrente das perdas eventuais da vida.

Os traços mentais distintivos da melancolia são um desânimo profundamente penoso, a cessação de interesse pelo mundo externo, a perda da capacidade de amar, a inibição de toda e qualquer atividade, e uma diminuição dos sentimentos de auto-estima a ponto de encontrar expressão em auto-recriminação e auto-envilecimento, culminando numa expectativa delirante de punição. Esse quadro torna-se um pouco mais inteligível quando consideramos que, com uma única exceção, os mesmos traços são encontrados no luto. A perturbação da auto-estima está ausente no luto; afora isso, porém, as características são as mesmas''. (FREUD, 1915)

A depressão afeta entre 2% e 5% da população nos países desenvolvidos.

Pesquisas têm sido feitas no sentido de encontrar terapêuticas eficazes para o combate à depressão. O uso de antidepressivos, especialmente os inibidores seletivos da recaptação da serotonina ou inibidores seletivos da recaptação da noradrenalina resulta em melhora  do estado de 70% dos pacientes com depressão, mas na clínica psicanalítica, não se pode perder de vista que a destrutividade e os sentimentos de culpa, que são tão  evidentes  nas queixas do deprimido precisam ser utilizados na elaboração das estratégias terapêuticas.  O que se percebe é que o afeto do deprimido é dirigido para o objeto perdido, ou seja, o desejo ou desesperança de recuperar algo que foi perdido.  E o objeto perdido na depressão patológica não é necessariamente um objeto real, uma pessoa, uma frustração, mas trata-se da perda de um objeto interno, inconsciente, uma perda de si mesmo, do seu ego, o que aponta para a importância da noção de narcisismo no tratamento. Também o Complexo de Édipo, com os desejos infantis parricidas se não tiver sido bem elaborado na infância, poderá acarretar a internalização do sentimento de culpa pelo fato de ter-se desejado a morte dos pais. É claro que esses desejos são recalcados, mas ao que parece é que esse desejo de morte, no filho, está voltado contra o pai e, na filha, contra a mãe, sendo essa a causa de todas as neuroses.

Freud faz a alusão da atualização no adulto, dos sentimentos parricidas infantis, através do relato de um caso, conforme segue:

Em outra ocasião, defrontei-me com o caso de um respeitável senhor, professor universitário, que nutria havia muitos anos o desejo natural de ser o sucessor do mestre que o iniciara nos estudos. Quando esse professor mais antigo se aposentou e os colegas informaram ao pretendente que ele fora escolhido para substituí-lo, começou a hesitar, depreciou seus méritos, declarou-se indigno de preencher o cargo para o qual fora designado, e caiu numa melancolia que o deixou incapaz de toda e qualquer atividade durante vários anos. (FREUD, 1916)

Na clínica psicanalítica, diante de um deprimido que demanda uma escuta para seu sofrimento, o que se procura é o desvelamento dos demônios que tem de ser laboriosamente extraído, pelo trabalho analítico, através das associações livres e do escrutínio dos sintomas. Uma penetração mais profunda na análise pode revelar que não é algo fora do comum para um homem adquirir uma depressão patológica e uma inibição em seu trabalho, em resultado da morte do seu pai ou de um superior admirado. Quando isto acontece, concluímos que o homem criança fora ligado ao pai por um amor especialmente intenso e recordamos com quanta freqüência uma depressão grave surge como forma neurótica de luto e como forma de auto-punição.

Assim, a combinação da psicanálise e do uso medicamentoso favorece a estabilidade do humor e a prevenção dos atos suicidas. O objetivo do tratamento medicamentoso é controlar os sintomas agudos, restaurar o funcionamento e prevenir a ocorrência de novos episódios. Os deprimidos quando são corretamente diagnosticados e tratados, o prognóstico é bom e as chances de recuperação são máximas, desde que o tratamento seja mantido por tempo suficiente, de meses a vitalício.

Referencias bibliográficas:
Freud, S. Luto e melancolia, Edição Standard brasileira (SB), v. XIV, p.275.
Freud, S. Alguns tipos de caráter encontrados no trabalho psicanalítico (1916).SB., v. XIX, p.358
3.Sadok BJ,Sadok VA.Manual conciso de psiquiatria clínica.2º ed.Porto Alegre.Artmed,2008.


2 comentários:

  1. cotidiana? quotidiana!!!

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  2. Cotidiano. Adj. 1. De todos os dias, diário. 2. Que se faz ou sucede todos os dias, diário. 3. Que aparece todos os dias; diário. 4. Que sucede ou se pratica habitualmente. S.m. 5. Aquilo que se faz ou ocorre todos os dias. 6. O que sucede ou se pratica habitualmente.

    Quotidiano. Adj. Cotidiano

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