quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Transtorno de Ansiedade de Separação: quando as perdas podem causar patologias

Este texto foi elaborado em resposta a uma leitora que solicitou artigos voltados para possíveis perdas e suas consequencias, quando ocorridas na infância ou adolescencia.
Busquei em alguns livros e no  Manual Estatistico de Diagnóstico de Saúde Mental - DSM-IV, um  resumo que trata sobre esse transtorno, suas possíveis causas e tratamento. Espero que esteja a contento!
Boa leitura!

Transtorno de Ansiedade de Separação: quando perdas podem causar patologias
Introdução
Ansiedade é um sentimento vago e desagradável de medo, apreensão, caracterizado por tensão ou desconforto derivado de antecipação de perigo, de algo desconhecido ou estranho.
Em crianças, o desenvolvimento emocional influi sobre as causas e a maneira como se manifestam os medos e as preocupações tanto normais quanto patológicas. Diferentemente dos adultos, as crianças podem não reconhecer seus medos como exagerados ou irracionais, especialmente as menores. A ansiedade e o medo passam a ser reconhecidos como patológicos quando são exagerados, desproporcionais em relação ao estímulo, ou qualitativamente diversos do que se observa como norma naquela faixa etária e interferem com a qualidade de vida, o conforto emocional ou o desempenho diário do indivíduo. Tais reações exageradas ao estímulo ansiogênico se desenvolvem, mais comumente, em indivíduos com uma predisposição neurobiológica herdada.
A maneira prática de se diferenciar ansiedade normal de ansiedade patológica é basicamente avaliar se a reação ansiosa é de curta duração, autolimitada e relacionada ao estímulo do momento ou não.
Os transtornos ansiosos são quadros clínicos em que esses sintomas são primários e é mais comum em crianças e pode desenvolver-se após algum estresse vital como morte ou separação de um parente ou animal de estimação, doença em um parente, mudança de escola, mudança para um novo bairro ou imigração. O início pode ocorrer já em idade pré-escolar ou em qualquer momento, antes dos dezoitos anos, embora raro na adolescência.
Estudos retrospectivos sugerem que a presença de ansiedade de separação na infância é um fator de risco para o desenvolvimento de diversos transtornos de ansiedade, entre eles, o transtorno de pânico e de humor na vida adulta.
O transtorno de ansiedade de separação é caracterizado por ansiedade excessiva em relação ao afastamento dos pais ou seus substitutos, não adequada ao nível de desenvolvimento.  A perturbação deve durar pelo período mínimo de quatro semanas, iniciar-se antes dos 18 anos e causar sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional ou em outras áreas importantes na vida do indivíduo. 
Os indivíduos com este transtorno podem experimentar sofrimento excessivo recorrente, quando do afastamento de casa ou de figuras importantes de vinculação. Quando afastadas dessas figuras, freqüentemente precisam saber do seu paradeiro e sentem necessidade de permanecer em contato, como, por exemplo, por meio de telefonemas. Alguns indivíduos sentem saudade extrema e chegam a sentir-se enfermos devido ao desconforto, quando estão longe de casa.  Eles podem ansiar pelo retorno ao lar e fantasiar a cerca da reunião com as figuras de vinculação. As se afastarem dessas figuras principais, esses indivíduos freqüentemente abrigam temores de que acidentes ou doenças acometam essas figuras a que têm apego ou a eles próprios.  As crianças com este transtorno expressam o medo de se perderem e jamais reverem seus pais. Elas em geral sentem desconforto quando viajam independentemente para longe de casa ou de outras áreas que lhes são familiares, podendo evitar a ida a qualquer lugar sozinhas. Pode haver relutância ou recusa a comparecer à escola ou acampamentos, a visitar ou pernoitar na casa de amigos ou a sair para cumprir pequenas incumbências. Essas crianças podem ser incapazes de permanecer no quarto sozinhas, podem exibir um comportamento dependente e andar “como uma sombra” atrás dos pais por toda a casa ou exigir que alguém as acompanhe quando vão a outra dependência da casa.
Além disso, podem ter dificuldades para conciliar o sono e podem insistir para que alguém permaneça a seu lado ate adormecerem. Durante a noite, podem ir à cama dos pais (ou de outra pessoa significativa, como um irmão) e, se o ingresso ao aposento dos pais é impedido, podem dormir junto à porta. Também pode haver pesadelos cujo conteúdo expressa os temores do individuo, como destruição da família por fogo, assassinato ou outra catástrofe.
As crianças com Transtorno de Ansiedade de Separação tendem a vir de famílias muito unidas. Quando afastadas de casa ou das figuras principais de vinculação, podem exibir, de um modo recorrente, retraimento social, apatia, tristeza ou dificuldade para concentrar-se na escola ou em brincadeiras. Dependendo da idade, os indivíduos podem ter medo de animais, monstros, do escuro, de ladrões, bandidos, seqüestradores, acidentes automobilísticos, viagens aéreas e outras situações percebidas como perigosas para sua integridade própria ou da família.  Preocupações com a morte ou o morrer são comuns. A fobia escolar pode acarretar dificuldades acadêmicas e evitação social. A criança deseja freqüentar a escola, demonstra boa adaptação prévia, mas apresenta intenso sofrimento quando necessita afastar-se de casa.  As crianças podem queixar-se de que ninguém gosta delas e afirmar que desejariam estar mortas. Quando extremamente perturbadas frente à perspectiva da separação, podem apresentar raiva ou às vezes agredir fisicamente a pessoa que esta forçando o afastamento. Quando sozinhas, especialmente à noite, as crianças pequena podem relatar experiências perceptivas incomuns (por exemplo, ver pessoas espiando dentro do quarto, criaturas assustadoras que tentam pega-las e sensação de que olhos as estão vigiando). As crianças com este transtorno às vezes são descritas como exigentes, intrusivas ou carentes de atenção. As excessivas exigências da criança podem se transformar em uma fonte de frustração para os pais, provocando ressentimento e conflito na família. Às vezes, essas crianças são descritas como excessivamente meticulosas, obedientes e ávidas por agradar. O humor depressivo em geral está presente, tornando-se mais persistente com o tempo, justificando um diagnostico adicional de Transtorno Distímico ou Transtorno Depressivo Maior. O Transtorno pode preceder o desenvolvimento de Transtorno de Pânico com Agorafobia. A comorbidade com outros Transtornos de Ansiedade pode ser comum, especialmente em contextos clínicos.  
Queixas sintomáticas, tais como: dor abdominal, dor de cabeça, náuseas e vômitos são comuns quando a criança percebe que seus pais vão se ausentar ou quando o afastamento realmente ocorre. Sintomas cardiovasculares (palpitação, tontura e sensação de desmaio iminente) são raros em crianças menores, mas podem ocorrer em indivíduos mais velhos. Esses sintomas resultam em exames físicos e procedimentos médicos, prejudicam a autonomia da criança, restringem a sua vida de relação e seus interesses, ocasionando um grande estresse pessoal e familiar. Sentem-se humilhadas e medrosas, resultando em baixa auto-estima e podendo evoluir para um transtorno do humor.
Tipicamente existem períodos de exacerbação e remissão. Tanto a ansiedade frente a uma possível separação quanto à esquiva de situações envolvendo o afastamento podem persistir por muitos anos. No entanto, a maioria das crianças com Transtorno de Ansiedade de Separação não demonstram sofrer de Transtorno de Ansiedade incapacitante.
Características específicas de cultura, idade e gênero
Existem variações culturais no grau em que é considerada desejável a tolerância à separação. É importante diferenciar o Transtorno de Ansiedade de Separação do alto valor atribuído por algumas culturas à forte interdependência entre os membros da família.
As manifestações do transtorno podem variar de acordo com a idade. As crianças mais jovens podem não expressar temores diante de ameaças especificas aos pais, ao lar ou a si mesmo e, à medida que crescem as preocupações ou temores em geral dizem respeito a perigos específicos, como seqüestro e assalto. A ansiedade e a antevisão da separação tornam-se manifestas em uma fase intermediária da infância. Embora os adolescentes com este transtorno, principalmente os do sexo masculino, possam negar a ansiedade acerca da separação, esta pode refletir-se em sua limitada atividade independente e relutância em sair de casa. Em indivíduos mais velhos, o transtorno pode limitar-se a capacidade de lidar com alterações nas circunstancias de vida, como mudança de domicilio e casamento.
Critérios Diagnósticos
Na avaliação desses transtornos, é fundamental obter uma história detalhada sobre o início dos sintomas, possíveis fatores desencadeantes (por exemplo: crise conjugal, perda por morte ou separação, doença na família e nascimento de irmãos) e o desenvolvimento da criança. Sugere-se, também, levar em conta o temperamento da criança (como presença de comportamento inibido), o tipo de apego que ela tem com seus pais (seguro ou não) e o estilo de cuidados paternos destes (ex. presença de superproteção), além dos fatores implicados na etiologia dessas patologias. Também deve ser avaliada a presença de comorbidades. A Ansiedade de Separação pode ser um aspecto associado de Transtorno Global do Desenvolvimento, Esquizofrenia ou outros Transtornos Psicóticos.
Tratamento
 De uma maneira geral, os transtornos ansiosos na infância e na adolescência apresentam um curso crônico, embora flutuante ou episódico, se não tratados. O tratamento é constituído por uma abordagem multimodal, que inclui orientação aos pais e à criança, terapia cognitivo-comportamental, psicoterapia dinâmica, uso de psicofármacos e intervenções familiares.
Quando há recusa escolar, o retorno à escola deve ser o mais rápido possível, para evitar cronicidade e evasão escolar. Deve haver uma sintonia entre a escola, os pais e o terapeuta quanto aos objetivos, conduta e manejo. O retorno deve ser gradual, pois se trata de uma readaptação, respeitando as limitações da criança e seu grau de sofrimento e comprometimento. As intervenções familiares objetivam conscientizar a família sobre o transtorno, auxiliá-los a aumentar a autonomia e a competência da criança e reforçar suas conquistas.
As intervenções farmacológicas são necessárias quando os sintomas são graves e incapacitantes, embora estudos controlados documentando seu uso sejam limitados. O uso de antidepressivos tricíclicos (Imipramina) mostrou resultados controversos. Os benzodiazepínicos, apesar de poucos estudos controlados que avaliem a sua eficácia, são utilizados para ansiedade antecipatória e para alívio dos sintomas durante o período de latência dos antidepressivos. Os inibidores seletivos da recaptura de serotonina podem ser efetivos para o alívio dos sintomas de ansiedade, sendo considerados medicação de primeira escolha devido ao seu perfil de efeitos colaterais, sua maior segurança, fácil administração e quando há comorbidade com transtorno de humor. A utilização de beta-bloqueadores em crianças não está bem estabelecida.
CONCLUSÃO
Até a década de 80, havia a crença de que os medos e preocupações durante a infância eram transitórios e benignos. Reconhece-se hoje que podem constituir transtornos bastante freqüentes, causando sofrimento e disfunção à criança ou ao adolescente. A identificação precoce dos transtornos de ansiedade pode evitar repercussões negativas na vida da criança, tais como o absenteísmo e a evasão escolar, a utilização demasiada de serviços de pediatria por queixas somáticas associadas à ansiedade e, possivelmente, a ocorrência de problemas psiquiátricos na vida adulta.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1-Organização Mundial da Saúde (OMS). CID-10 ¾ Classificação Internacional de Doenças, décima versão. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 1992.
2- DSM-IV - Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. Porto Alegre, Ed. Artes Médicas, 2002.
3- ISOLAN, T.; PHEULA, G.. Tratamento do transtorno de ansiedade social
em crianças e adolescentes. Revista de Psiquiatria Clínica, v. 3, n.2, p. 147-151, 1999.

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