segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Uma Casa

Recebi esse poema de uma pessoa que ao longo do tempo se tornou uma amiga - Anabela. Gostaria de compartilhá-lo com voces:

"Uma casa pode ser moldura para muitas histórias, abrigo para muitos afetos, atalho para muitos achados.
A casa traçada pela minha imaginação é assim: cúmplice clandestina dos meus absurdos, desejos surdos, meus cantos escuros. Uma casa em que eu possa escancarar meus quartos secretos, instalar minhas coisas do passado e minhas idéias descabidas.

Uma casa em que caibam os meus abraços e os meus embaraços. Uma casa em que eu possa trapacear a tristeza, encolher o cansaço, soltar meus anjos e amassar meus demônios. Uma casa para alargar as minhas liberdades, amar de verdade e fluir minhas vaidades. Uma casa que me permita estreitar meus limites, espreitar as minhas manhas, ter preguiça de manhã. Uma casa para acomodar as minhas incoerências, aquietar as minhas doiduras, espichar as minhas querências.
Uma casa em que eu possa largar o corpo e assanhar a mente, recebendo o calor do sol, que, sem pudor, espia por todas as frestas. Ah, uma casa de onde eu possa farejar as manhas, com cheiro de flores, cheiro de ervas, madeira secando.
Meu doce predileto fumegando na panela, que é pra enganar as minhas gulas.
Uma varanda para escorregar as minhas manias e lustrar meus afetos. É sentada na varanda que eu quero sentir o hálito das tardes frias, assistindo as aves se empoleirando, apressadas, aturdidas. E é da varanda, também, que quero vigiar o vermelho dos gerânios invadir o branco das janelas. De jeito igual ao dos pés de primavera cor-de-rosa, se escorando nas vigas do telhado. é essa a parte da casa que vai amarzenar as minhas euforias e esconder as minhas desistências.
Eu quero uma casa em que eu possa tropeçar nas minhas desordens e expor as minhas emoções mais afoitas. Um pedaço de sossego, que receba meus humores com alarde e sem rumores. Uma casa a que eu possa confiar os resíduos da minha história.
E, daqui a sei lá quanto tantos anos, ainda me conceder as lembranças de tudo o que nela teria vivido."

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