terça-feira, 2 de novembro de 2010

PSICOFÁRMACOS SAO IMPORTANTES PARA A SAÚDE?*

O uso de medicamentos sempre foi motivo de preocupação para a sociedade. Perguntas como: remédios viciam?  Psicofármacos e psicotrópicos são a mesma coisa? Quem pode precresver? Quem deve tomar?  

Estas perguntas estiveram muitas vezes associadas a preconceitos, tabus e mitos, como se quem os tomasse fosse portador de algum tipo de loucura.

É importante pensarmos que a clínica psiquiátrica é uma especialidade médica ligada ao funcionamento cerebral e dirigida ao ser humano tomando-o em todo o seu ser, qual seja, seu comportamento, sua linguagem, seus afetos e suas emoções. Se algum desses aspectos do sujeito apresentar afetado, o medicamentoso poderá auxiliar como uma das possibilidades de tratamento.  Pierre Benoit diferencia medicamentos de remédios. Para ele, medicamentos são substâncias empregadas no combate à doença, enquanto que os remédios são tudo aquilo que serve para consolar os infortúnios da existência para fazer cessar os males, ou mesmo aplacar um sofrimento moral.

Assim, a psiquiatria pode utilizar tanto de medicamentos quanto remédios.  Na literatura, medicamentos, remédios ou fármacos são classificados como substâncias químicas capazes de prevenir e aliviar sintomas ou mesmo curar doenças ou enfermidades.
Droga no sentido médico é qualquer substância capaz de provocar alterações no organismo e que pode ser empregada no homem ou em animais com a finalidade de diagnóstico, tratamento ou profilaxia de doenças. Também é uma palavra usada para indicar substâncias alucinógenas ou estimulantes, capazes de alterar o estado psíquico do usuário e lhe provocar sensações agradáveis ou desagradáveis.

Foi Kraepelim que por volta de 1892 utilizou a palavra Farmacopsicologia pela primeira vez, e então, foi considerado o pai da Psicofarmacologia.
Psico - elemento antepositivo derivado do grego psikhê: sopro, alma - Psikhê, na mitologia grega é o nome de uma jovem princesa por quem Cupido se apaixonou; é também nome de um espelho que provavelmente recebeu esta denominação pelo fato de que a mulher que nele se olhava sentia-se bela como Psikhê, a amada de Eros.
Fármaco vem do grego pharmakon = medicamento.
Log(ia)/Iogos= ciência, linguagem, razão.

Então Psicofarmacologia é a ciência dos medicamentos para o sopro da vida. É o estudo das substâncias psicoativas que segundo a OMS são aquelas que alteram o humor, a cognição e o comportamento ou seja afetam a nossa mente. Entre as substâncias psicoativas existem aquelas que têm também a propriedade de induzir estado de dependência. As substâncias deste grupo recebem a denominação de Psicotrópicos. As distinções entre medicamentos psicoativos e psicotrópicos, no Brasil, eram feitas através da Portaria DIMED 27/86 ( para os psicoativos que não induzem dependência; entre eles, antidepressivas e neurolépticos ­exigência de receita carbonada) e da Portaria DIMED 28/86 ( para os psicoativos que induzem dependência, ou seja psicotrópicos - faixa preta e exigência das notificações A e B). Estas duas Portarias foram recentemente substituídas pela Portaria 344 de 12/05/98, mas a exigência destas notificações ou da cópia carbonada continua, sendo que para esta última exige-se agora receita especial, ou seja, a Notificação A, numerada, fornecida pela Autoridade Sanitária Local (AS L) ao médico devidamente cadastrado, é utilizada para a prescrição de analgésicos opiáceos e drogas tipo-anfetamina que estão nas listas A1, A2 e A3 da Portaria 344. A Notificação B é confeccionada pelo médico, mas contendo numeração oficial fornecida pela ASL, e destina-se à prescrição de ansiolíticos, hipnóticos, barbitúricos, triexifenidila e substâncias tipo-anfetamina utilizadas como anoréticos; estas substâncias estão nas listas B1 e B2 da Portaria 344. Finalmente, as substâncias anestésicas, antiparkinsonianas, neurolépticas, antidepressivas, antiepilépticas, deverão ser prescritas em cópia carbonada em receita especial impressa pelo próprio médico, constam da lista C1.

PSICOTRÓPICO (trópico = direção, ter atração por ...): são drogas que atuam sobre o cérebro, alterando de alguma maneira o psiquismo.

Corpo, soma, cérebro (matéria), mente, psico, alma, espírito.

Ao falar de Remédios quero situá-los como objetos da Medicina. Os objetos da Medicina são aqueles que podem figurar numa receita como os remédios, os regimes, os conselhos, os processos mentais, as idéias, as teorias que o homem elabora (o diagnóstico) e que dão origem ao uso dos objetos que aparecem nas receitas. Pois bem, este conjunto de objetos é chamado por P. Benoit de Medicinal; o "medicinal" é variável de acordo com as épocas e as culturas. As idéias que fundamentam o Medicinal não são privilégio daqueles que tratam, elas existem também naqueles que são tratados e em seu círculo de amizades, e o Medicinal do médico não funciona em harmonia com o Medicinal do paciente; entram nesta história fazendo dissonância os objetos imaginários (alucinatórios, fantasísticos) que são puros produtos das camadas mais arcaicas da realidade psíquica, permanecendo inconscientes, uma vez que foram precocemente construídos através das experiências infantis. Exemplo: o bebê que alucina o objeto que lhe falta (o seio, a mamadeira, a voz da mãe, o xodozinho como uma fralda ou uma ponta de cobertor ou um travesseirinho) que lhe é indispensável para lhe dar tranqüilidade e sono; obtêm desta forma satisfação com estes objetos faltosos, satisfação esta que é diferente da satisfação da necessidade. Ora a conexão entre estas duas espécies de objetos é atuante no que concerne à Medicina e à Psiquiatria, na medida em ambos os objetos estão destinados a se opor ao sofrimento humano (referindo-se aos medicamentos ao sofrimento que a doença causa). Esta poderosa conexão entre os objetos concretos do medicinal e os objetos da realidade psíquica devem ser levados em consideração tanto na saúde como na doença. É neste contexto que se insere o efeito Placebo /Nocebo e o uso do termo doença psicossomática, por aí passa o nexo entre o psíquico e o somático. Resta-nos mais um mistério que nos leva a estudar as formas de mútua intervenção entre o corpo e as emoções.

Os medicamentos são classificados segundo a finalidade com que são ministrados:
Curativos: quimioterápicos, antibióticos, antiprotozoários e antiparasitários. Paliativos: normalizam as funções do organismo durante o período em que são ministrados, como os hormônios, diuréticos, antiinflamatórios, antihipertensivos, imunossupressores, antidepressivos, antipsicóticos e ansiolíticos.
Sintomáticos: suprimem ou atenuam um sintoma que pode corresponder a diversas enfermidades: como antitérmicos, antitussígenos, antidiarréicos e antihistamínicos.
Profiláticos: sobretudo as vacinas e em circunstâncias especiais alguns antibióticos e quimioterápicos.
Placebos: são os chamados medicamentos naturais, fitoterápicos ou os da medicina alternativa. São remanescentes de um período que se sabia pouco sobre fisiologia, fisiopatologia e farmacologia, ainda são muito populares nas camadas menos informadas da população.

De acordo com o direcionamento de sua propaganda as drogas podem ser: éticas: aquelas em que a propaganda é feita apenas para médicos; não éticas:  divulgação junto a população.

Em função da lei de patente: quando o fármaco é descoberto ou sintetizado, o responsável pela descoberta submete o produto' a Organização Mundial de Saúde, com o nome baseado em sua estrutura química e suas propriedades farmacológicas e, se aprovado, o fármaco passa a ser identificado por este nome, chamado de genérico. Quando chega à categoria de medicamento e passa ser industrializado com uma finalidade específica ele recebe um nome de marca ou nome comercial, dado pelo fabricante, este nome é patenteado nos órgãos de propriedade industrial e daí por diante só pode ser usado pelo detentor da patente. Só após vencido o período de patente do produto ele pode ser vendido com o nome genérico, isto é sem o nome de marca.

No Brasil, atualmente, temos quatro categorias de medicamentos: os originais ou de marca, os similares, os genéricos e os manipulados. Os originais são os inovadores, ou de marca, constituem parâmetro de referência para os genéricos. Os similares são os medicamentos que apresentam o mesmo princípio, mesma concentração, mesma forma farmacêutica, mesma via de administração, posologia e indicação do medicamento original ou de referência. Não podem ser considerados intercambiáveis ou substituÍYeis pelos originais, pois não foram submetidos aos testes de bioequivalência e biodisponibilidade, na época em que foram registrados. Estes testes não eram exigidos e só o sendo a partir de 1997.

Para finalizar vamos citar a classificação usual dos Psicotrópicos que podem ser classificados em três grupos de acordo com a atividade que exercem junto ao cérebro:
Depressores da atividade do SNC
Estimulantes da atividade do SNC
Perturbadores da atividade do SNC

A maioria dos psiquiatras adota a classificação proposta por Jean Delay e Deniker:
1.               Psicolépticos
2.               Hipnóticos
3.               Neurolépticos
4.               Tranqüilizantes
5.               Psicoanalépticos _ Estimulantes da vigília
6.               Estimulantes do humor
7.               Psicodislépticos _ Agentes alucinogênicos ou despersonalizantes.

Algumas modificações foram feitas para inclusão de novas drogas :
Psicolépticos:
Hipnóticos
Tranqüilizantes
Neurolépticos

Estas drogas diminuem o tono psíquico, a vigília, estreitam a área cognitiva, aliviam as tenções emocionais e diminuem as funções motora e sensorial.
Psicoanalépticos: - Timoanalépticos - Timeréticos
Psicotônicos ( PSICOESTIMULANTES: aumentam a atividade geral mas sem melhorar o humor ). Compostos diversos - Ativam o sistema nervoso central, exacerbam a vigília e aumentam o ânimo.
Psicodislépticos: - Euforizantes
Alucinogênicos ou despersonalizantes.
Produzem ruptura do equilíbrio psíquico e alterações da senso-percepção, do pensamento e do comportamento motor.
Panpsicotrópicos – Anticonvulsivantes - drogas de efeito clínico múltiplo ou mal definido.
A Psicofarmacoterapia pode ser dividida em três períodos conforme sua evolução histórica.
1.Período mitológico-histórico: uso de substâncias de origem animal, vegetal ou mineral como o ópio, passiflora, beladona, eritro-xilon-coca, rauwolfia serpentina, mandrégora e outras. O final deste período é marcado pelos relatos literários de Thomas de Quincey, em 1821, descrevendo suas auto-experiências com o ópio " The Confessions of na English Opium Eater. "
2.     Período pré-científico: assim chamado porque os métodos e as técnicas cientificas utilizadas não eram ainda sofisticados e precisos.
Inicia-se por volta de 1845. Em 1829 Thudichum anunciava que as doenças mentais eram resultantes de alterações bioquímicas no cérebro.
Alguns livros como: Du hachich et I'alienation mentale de Moureau e de Tours; Les paradis artificiels de Charles Baudelaire, chamaram atenção em 1860, como resultado de auto­observação com o haxaixe.
Somente em 1883 se começa a realizar investigação de cunho mais científico com Kraepelin em um artigo intitulado "Sobre a ação de algumas substâncias medicamentosas na duração de certos fenômenos psíquicos elementares." Em 1892 Kraepelin publica os resultados de suas pesquisas sobre a morfina, o chá, o éter, o c1oraldeido e o paraldeido.
Em 1862 se descobre os Barbitúricos que só serão utilizados em 1903.
Em 1920 Klasi, na Suíça, emprega o sono químico que era uma mistura de morfina, escopolamina e do sonifeno. Surgem as Anfetaminas para tratamento das Depressões.
3. Período da psicofarmacologia propriamente dita ou científica.
Os principais fatos que contribuíram para o aparecimento da PSicofarmacologia contemporânea foram:
1943 Alberto Hoffman intoxica-se com o esporão do centeio e descobriu as propriedades do Ácido Lisérgico.
1949 Cade relatos efeitos do lítio na Mania.
1952 Charpentier sintetizou a C1orpromazina (AMPUCTIL).
Laborit estuda os efeitos calmantes dos derivados das fenotiazinas. Hanon usa a Clorpromazina no tratamento da Mania.
Delay e Deniker passam a usar a Clorpromazina no tratamento das psicoses.
1956 Delay e Thuillier , na França, propõem a criação de uma nova disciplina a Psicofarmacologia, expressão derivada de Psychopharmacon, usada em 1548 por Reinhard Lorichius, não com o sentido atual. Constituiu-se , então, uma nova ciência interdisciplinar, aparentada com a Bioquímica, a Farmácia, a Sociologia e a Psiquiatria.  

HOJE: O surgimento da Psicofarmacoterapia incitou o estudo objetivo dos problemas nentais e permitiu que se voltasse atenção para anatomia, fisiologia e química do SNC.
A idel)tificação detalhada do Sistema Límbico, com suas complexas interligações anatômicas e funcionais, a aplicação de novos métodos de estudo do SNC através de microeletrodos" a implantação de eletrodos em animais, a iontoforese, o mapeamento cerebral e outros métodos de pesquisa possibilitaram uma compreensão mais objetiva da doença mental e viabilizaram a descoberta de novas substâncias que vieram humanizar o tratamento e trazer mais qualidade de vida para os doentes .

*Texto resumido de trabalho escrito por Maria Letícia Ferreira – Psiquiatra, em Belo Horizonte, 08 de agosto de 2002.

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