segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Classificação do desenvolvimento do comportamento anti-social persistente e adolescência

Adolescence-limited and life-course-persistent antisocial behavior: A developmental taxonomy.
By Moffitt, Terrie E.
Psychological Review, Vol 100(4), Oct 1993, 674-701.


Introdução:

Este trabalho trata da resenha de um artigo publicado na revista Psychological Review, 1993,  e contem um estudo sobre o comportamento anti-social demonstrando que durante a fase da adolescência há uma prevalência do comportamento anti-social e que este comportamento tende a desaparecer com a maturidade. Apenas pequeno grupo da população mantém o comportamento anti-social durante a vida adulta. Assim, o comportamento anti-social em determinados grupos populacionais são temporários e situacionais e em outros são persistentes. Aponta, ainda, que jovens que foram crianças com problemas neuropsicológicos associados a outros fatores, como maus tratos na sua história infantil apresentam maior desajuste social.

Métodos:

O estudo foi feito através de levantamentos bibliográficos sobre o tema e levantamentos populacionais em que o autor discorre apresentando dados estatísticos, gráficos, relatórios e questionários aplicados por especialistas ao sujeito em questão, professores e familiares. Já em suas exposições iniciais o autor apresenta um gráfico em que, de acordo com relatórios criminalísticos, o maior número de delinqüências é cometido na adolescência, principalmente para indivíduos do sexo masculino, na idade em torno dos 17 anos, e decresce em 50% quando esta população atinge a idade de 20 anos diminuindo ainda mais em torno dos 28 anos.  Porém, o que preocupa de fato é a porcentagem da população que permanece com o comportamento anti-social persistente.




Resultados:

Moffit realizou vários levantamentos bibliográficos e estatísticos do tema em questão neste artigo e, dentre eles, analisando longitudinalmente uma amostra da população de crianças da Nova Zelândia, nos anos1972-1973, o autor pode nos apontar dois grupos de adolescentes com comportamentos anti-sociais, sendo que um grupo apresenta esse comportamento especialmente durante a adolescência enquanto outro grupo apresentou o comportamento desde a infância e permanece com o comportamento anti-social também após a idade adulta. Aponta que crianças que possuem déficits cognitivos que atingem a memória, leitura, escrita, interpretação, verbalização, resolução de problemas e outras funções executivas possuem grande possibilidade de adotar condutas anti-sociais. Outros fatores neuropsicológicos também podem estar associados, como a hiperatividade, o déficit de atenção e a impulsividade. Afirma que o comportamento anti-social possui uma preponderância no gênero masculino e comparando os dois grupos, o autor ressalta que “um corpo substancial da pesquisa longitudinal aponta consistentemente a um grupo muito pequeno de machos que indicam taxas elevadas de comportamento anti-social através do tempo e em situações diversas”.

O autor, ao longo do estudo ressalta que o ambiente interacional da criança, compreendido pela família na sua relação pais-filhos, escola e outros ambientes podem agravar as condições que promoveriam uma conduta anti-social na criança. Assim, a gestação em que a mãe faz uso freqüente de álcool ou drogas comprometeria o desenvolvimento neuronal do feto e isso, se associado a negligencia dos familiares no cuidado da criança, maus tratos e outros abusos seriam fatores de contribuição para a formação de uma personalidade com comportamento anti-social que poderia inclusive, persistir no jovem ao longo da vida adulta.

Apesar de ser pequena a porcentagem da população que mantém ao longo da vida o comportamento anti-social, este indivíduo apresenta desde a infância indícios de comportamentos desviantes como fazer birras, morder, bater, cometer pequenos furtos, mentir, utilizar de ociosidade e que se agravam durante a vida adulta e que geram, ao mesmo tempo, uma reação muitas vezes agressiva do ambiente em que estão inseridos.

Autores como Coie, Belding, & Underwood, 1988; Rodeio, Coie, & Brakke, 1982; Vitaro e outros, 1990, ressaltam que crianças cujo comportamento é agressivo desde a infância naturalmente repelem oportunidades de adotarem comportamentos pro-sociais ou de adquirirem novos repertórios de comportamentos socialmente aceitáveis. Desta forma, são constantemente rejeitados por seus pares e por adultos.

Este artigo cita autores como Oeste e Farrington (1977) que observaram que o prognóstico para o indivíduo com comportamento anti-social persistente é desolador, uma vez que muitas vezes o mesmo se vê envolvido com drogas e álcool, muda constantemente de emprego, é impulsivo e violento, contrai dívidas, agrava a pobreza, adota comportamentos de risco como dirigir bêbado, relacionamentos múltiplos e instáveis, promiscuidade sexual, imprudência, falta de capacidade para a lealdade e amizade, falta de empatia e falta de remorço ou vergonha, dificuldade para envolver-se afetivamente e outras características compatíveis com sintomas de doenças psiquiátricas.

O autor ressalta que pela apuração dos levantamentos longitudinais do comportamento do sujeito ao longo da sua vida efetuado através de relatórios judiciais, percebe-se que os psicopatas diminuem suas condutas ofensivas e criminosas em torno dos 40 anos, mas arrastam atrás de si uma constelação de traços anti-sociais da personalidade que poderiam ser confirmados através de relatórios escolares, relatórios trabalhistas e até mesmo em fichas policiais. Duvida-se que esse comportamento realmente se extinga em torno dessa idade, pois o que se hipotetisa é que a justiça acaba por ser mais conivente com criminosos idosos além de outros fatores que poderiam confundir os números estatísticos levantados.

O autor salienta que o avanço da idade cronológica em direção a maturidade faz com que indivíduos que apresentaram condutas anti-sociais na adolescência possam ter acesso a papéis adultos mais valorizados socialmente e adquiram uma motivação para exercê-los quando atingem a maioridade. Também avalia que mecanismos de aprendizagem poderão reforçar ou extinguir comportamentos indesejados. Então, para populações de crianças e adolescentes relativamente saudáveis, mudanças de contingências poderão promover o declínio do comportamento anti-social. Há de se considerar também, que o indivíduo que possui uma história pregressa com algum rol de comportamentos pro-sociais, habilidades acadêmicas e facilidade de relacionamentos interpessoais poderá angariar para si uniões afetivas, continuidade dos estudos acadêmicos  e o ingresso no mundo do trabalho, desviando-o do seu comportamento anti-social.

Porém, o que é mais preocupante é que, conforme o autor, os indivíduos com comportamentos anti-sociais persistentes na vida adulta não desistem da delinqüência e não são permeáveis a intervenções.

Avaliação:

É importante discriminar os comportamentos anti-sociais normativos dos comportamentos patológicos e conseqüentemente, reconhecer os fatores de risco que tornam determinados grupos vulneráveis para que, com base nesse estudo, busque-se as implicações etiológicas, seu desenvolvimento, os prognósticos e as estratégias de tratamento.

Um comportamento anti-social na infância ou adolescência não implica necessariamente em uma continuidade deste comportamento na vida adulta, pois a maior parte dos adolescentes abandona a sua vida de delinqüência quando os estilos pro-sociais no seu ambiente são mais apreciados, utilizando suas respostas anti-sociais apenas em situações em que necessitam desse “instrumental”.

A síndrome do comportamento anti-social persistente tem uma base biológica em deficiências orgânicas sutis do sistema nervoso, mas que não são determinísticas (Moffitt, 1990) e é ainda, associada a outros transtornos mentais. Os indivíduos com essa síndrome são impermeáveis a intervenção e adotam esse comportamento indiscriminadamente em qualquer situação. Servem ainda de modelo para os jovens adolescentes que os imitam e os idealizam, pois nossa sociedade acaba reforçando modelos agressivos.

 O autor enfatiza que não é a gravidade das sanções e punições legais que inibirão o indivíduo com comportamento anti-social persistente a desistir do crime.  Avalia que estes indivíduos possuem traços com desordem de personalidade, déficit cognitivo e histórias de vida de privações que os impedem de buscar resultados pró-sociais e explorarem novos caminhos na vida.

Conclusão:

Nossa sociedade globalizada com suas formas de modernidade não tem avaliao as implicações dos avanços tecnológicos para a formação de novos comportamentos e novas sociedades. Algumas conseqüências são visíveis, a como a precocidade da puberdade, a adoção de novas configurações parentais, mudanças nos papéis sociais, a dificuldade dos membros da família compartilharem o dia a dia entre-si, a supremacia da estética sobre a ética, a valorização do relativismo absoluto, a banalização da sexualidade e da violência, a acentuação da urbanização com a promoção do afastamento entre as gerações onde, tudo isso ou grande parte podem ter influenciado possibilitado fazer emergir um grupo de indivíduos cujo comportamento desviante é padrão.

É fato que a adolescência contêm em si características biológicas e psicossociais próprias decorrentes inclusive das mudanças hormonais, e dentre elas, a rebeldia e os comportamentos desviantes se destacam, porém, comparações estatísticas sugerem que as curvas para a maioria dos crimes na adolescência têm aumentado nas últimas décadas.

Para comportamentos anti-sociais na adolescência, também deve-se considerar fatores causais, como situação socioeconômica desfavorável, desemprego, valores do meio social com aprovação para a violência e outras variáveis que de certa forma, predisporão o individuo a condutas desviantes.

Para se obter uma amostra de indivíduos com comportamentos anti-sociais persistentes há de se fazer um recorte dentro da população da adolescência e procurar pelas características da personalidade do indivíduo e não por seu comportamento manifesto.

Segundo o autor, menos de 10% dos indivíduos do sexo masculino apresentam comportamento anti-social que começam antes da puberdade e se estende, em grau ainda mais acentuado através do tempo e das circunstancia para além da adolescência. Aponta ainda que “macho que se abstêm de toda delinqüência é raro”.

Para uma pesquisa consistente devem-se estudar os indivíduos longitudinalmente e descrever suas trajetórias, obtendo materiais de fontes múltiplas e através das circunstancias. Deve-se ainda ser sensível as diferenças individuais, para somente então predizer os resultados.

Se o objetivo for a prevenção ou o tratamento, uma conjuntura social será convocada a participar oferecendo oportunidades para a desistência do comportamento anti-social e a opção para o recomeço de um estilo de vida convencional e com sucesso. Assim, necessário se faz atitudes preventivas no seio familiar e na comunidade desde a infância, puberdade e adolescência, mas considerando-se, porém, que certa dose de delinqüência na juventude não é patológica. Na adolescência, ofertas de oportunidades que favoreçam a transição para o trabalho e a união afetiva são favoráveis.

 Para os indivíduos com comportamentos anti-sociais persistentes que são impermeáveis a tratamento, a seleção de trabalho e parceiros que suportem seu estilo anti-social é importante, pois os mesmos não deixarão de expressar seu jeito de ser em casa ou no trabalho.

Assim, pensar nas causas, conseqüências e formas de prevenção e tratamento para indivíduos com comportamento anti-social requer pesquisa, estudo interdisciplinar e atuação conjunta de vários segmentos da sociedade.

Resenha elaborada por Eliana Olimpio para o Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde: Saúde da Criança e do Adolescente, Disciplina: Aspectos biopsicossociais da saúde na infância e adolescência, Docente: Vitor Geraldi Haase, Belo Horizonte, jun/2010.

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